terça-feira, 30 de setembro de 2014

LInchamentos e Sherazade: o limite do que dizer.


Sabe-se que e Brasil é um dos países em que há mais casos de linchamento. Sendo assim, reflita se erraria a jornalista que manifestou sua opinião ( até certo ponto benevolente) em rede nacional para o caso do mocinho  linchado, ferido e amarrado num poste.
Analise até onde vai o direito de manifestação de opinião por meio da mídia.  Atente para o fato de que vivemos hoje a adesão às redes sociais. 

TEXTO 1
Fabiane, 33, era mãe de duas garotas - de 12 anos e 1 ano -, esposa dedicada à rotina de casa, diarista eventual em casas de famílias e de turistas de fim de semana e religiosa.
Ela viu-se confundida com o demônio que só existia na alma fria e inconsciente da internet alimentada por algum irresponsável, paradoxalmente responsável pela fanpage "Guarujá Alerta", e no subconsciente de um povo que ainda crê ser possível reeditar a Lei do Talião – "olho por olho, dente por dente" – e o princípio bárbaro de quem imagina ser possível fazer justiça com as próprias mãos.
A raiz da tragédia vivida por Fabiane em sua morte selvagem é social, sem dúvidas, mas sua raiz é tecnológica: a internet democrática por natureza, aberta por definição, desfazedora de arranjos sociais confortáveis ao poder estabelecido por missão (afinal, dá voz igual a todos, e tem de ser assim).
A rede carece de padrões de credibilidade que definam o que é joio e trigo, como desde que o mundo é mundo se faz nos veículos tradicionais de comunicação. E que ajudem a separar joio de trigo, fazendo germinar o trigo, disseminando-o, e incinerando o joio.
O corpo disforme e conspurcado de Fabiane, jovem que surgia doce nas fotos inocentes de uma vida plácida em família, publicadas depois da tragédia por reportagens que tentaram explicar o inexplicável e resgatar o que já se alienou, tem de ser o derradeiro sinal de alerta para a sociedade brasileira: internet é capaz de matar. No caso dela, matou com requintes flagrantes de crueldade e vileza.

TEXTO 2
Esses são apenas alguns dos casos de linchamento e tentativas de linchamento ocorridos no Brasil neste ano, que lemos como se fossem episódios da violência a que já nos acostumamos. Mas, diferentes de outros crimes, os linchamentos e tentativas são formas auto-defensivas de vingança. São execuções comunitárias. É a sociedade que lincha. Revelam um persistente traço da nossa cultura, valores fundantes do que somos.
Qualquer um pode se ver subitamente envolvido num ato de linchamento. Uns com mais probabilidade, outros com menos. E pode se surpreender depois, quando confrontado com o fato consumado. É como se tivéssemos dupla personalidade, a pior elas mobilizada por uma violência insuportável e moralmente intolerável.
Esses linchamentos e tentativas são a ponta extrema e indesejável de um modo de ser que se oculta de vários modos em nosso dia a dia. Não é casual que o Brasil seja um dos países que mais lincham no mundo e não é de hoje. A palavra “linchamento” apareceu nos Estados Unidos no século dezoito. Mas nós já linchávamos no século dezesseis. Há episódios de linchamento registrados em todos os cinco séculos da história brasileira. A permanência dessa forma de justiçamento popular é indicativa da força persistente da mentalidade que a preside, da estrutura social anômica, patológica, em que se apóia, de nossas insuficiências e dilemas crônicos.
Dentre os fatores da persistência desse grave problema social estão os limites mais do que conhecidos e proclamados do acesso da massa da população à Justiça. Burocrática, lenta e até injusta na própria ineficiência, a Justiça permite assim que subsista a vendeta como forma de punição dos crimes intoleráveis, como esses que foram apontados. Justiça cara, ineficiente e elitista não educa para a prática da justiça, abrindo espaço para legitimar, aos olhos do povo, o justiçamento.
Já houve caso de linchamento em São Paulo em que os fregueses de uma padaria numa manhã se improvisaram em juízes e tribunal, capturaram um jovem delinqüente na favela próxima, acusaram-no de crimes cometidos contra a vizinhança, deram-lhe a palavra para se defender, abriram a oportunidade para despedir-se da família, ofereceram-lhe um cigarro e o lincharam ali mesmo. Uma indicação clara do que é na concepção popular essa forma de violência, uma justiça substitutiva da Justiça faltante. Mas também uma caricatura trágica do que é justiça para amplos setores da população.
Os linchamentos não ocorrem unicamente em relação a crimes gravíssimos como o estupro e o incesto que, na mentalidade popular são crimes que despojam seus autores da condição humana e por isso mesmo devem ser reparados pela eliminação cruel e coletiva do criminoso. Há linchamentos por causas banalíssimas. http://www.trela.com.br/arquivo/O-Brasil-que-lincha

Texto 3
Deixa Sheherazade falar
Só quando garantimos o livre discurso dos mais radicais em uma sociedade é que realmente expomos seus vícios
Em fevereiro, a comentarista e âncora do telejornal SBT Brasil Rachel Sheherazade se tornou uma das mais conhecidas personagens das redes sociais. “No país que ostenta incríveis 26 assassinatos a cada 100 mil habitantes”, disse no ar, “a atitude dos vingadores é até compreensível.” Referia-se aos justiceiros cariocas que acorrentaram um adolescente de rua negro contra um poste, pelo pescoço, com uma tranca de bicicleta. Qual fora escravo. A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) pediu investigação à Procuradoria Geral da República. O Sindicato de Jornalistas do Rio publicou nota de repúdio. No início de abril, quando Sheherazade saiu de férias, circulou pela imprensa o rumor de que havia sido afastada pela emissora por pressão do governo. Houve quem celebrasse. É um erro.
Sheherazade é um fenômeno da internet que provavelmente não ganharia tanto espaço noutros tempos. A baixa audiência de seu telejornal é compensada por inúmeras cópias de seus comentários, quase sempre inflamatórios, no YouTube. Muitos a defendem. Assim como muitos por ela sentem repugnância. A jornalista não faz concessões ao bom gosto: é uma radical. Mas liberdade de expressão jamais é testada pelos razoáveis, pelos moderados, pelos de bom gosto.
O principal argumento contra Sheherazade parece partir do bom senso: faz apologia ao crime. Parece bom senso. Não é. Apologia ao crime é dos argumentos mais perigosos que se pode levantar contra a opinião de alguém. Há quem defenda o livre fumo de maconha. É crime. O aborto tem defensores. Igualmente crime. Defende-se a ocupação de propriedade privada por quem precisa de moradia e não a tem. Crimes todos. As duas primeiras defesas não costumam incomodar quem é liberal ou de esquerda. A última raramente perturba a esquerda. Considerar alguns crimes defensáveis ou não tem a ver com ideologia, não com o que é razoável. Nossa ideologia, claro, sempre nos parece razoável. O inferno são os outros.
Há um excelente argumento para permitir que Sheherazade fale, por mais desagradáveis que possam ser suas opiniões. Ela representa um pedaço do Brasil. Basta passar os olhos pelas discussões na rede. Um bom naco dos brasileiros vai para além do conservadorismo: é reacionário. Talvez seja aquele quarto da população que, segundo o Ipea, considera que a roupa da mulher justifica o estupro. Seus representantes talvez sejam os que defendem abertamente os justiceiros ou fazem justiçamentos. Este é um pedaço do Brasil. Se calamos uma voz que “os compreende”, desligamos um alerta. Sem este alerta, desaparecem as vozes e os argumentos contra.
Thomas Jefferson, cuja data de nascimento foi celebrada domingo, disse que “a liberdade de expressão não pode ser limitada sem ser perdida”. Os EUA, país que ajudou a fundar, têm a legislação mais incisiva na defesa da livre expressão. Não quer dizer que seja absoluta. Mas que, antes de punir o discurso, pesam se vale o risco. Porque, a não ser que os critérios para punir o discurso sejam extremamente rigorosos, fica fácil demais. E a censura se estabelece.
Incitação ao crime é critério para punir a fala. Mas é preciso provar que um crime ocorreu causado por ela. Uma coisa é desejar a morte de alguém numa conversa de bar. Outra é clamar pela morte da pessoa, em frente a sua casa, perante uma turba em fúria. Não se pune a mensagem. Punem-se os efeitos concretos da mensagem.
Pode não parecer intuitivo, mas é só quando garantimos o livre discurso dos mais radicais em uma sociedade, à direita e à esquerda, que realmente expomos seus vícios. Só assim somos realmente livres. A internet é uma máquina de livre expressão. Que seja amplamente usada.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/deixa-sheherazade-falar-12195667#ixzz2z3GLTtak

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segunda-feira, 29 de setembro de 2014

MCs mirins ganham fama com letras sobre sexo e luxo LEANDRO MACHADO

PROPOSTA NÃO PRONTA

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MC Pedrinho, menos de um metro e meio de altura, está famosinho. Canta, dança, faz shows em casas lotadas. Responde a fãs apaixonadas. Pedrinho, 11, está bombando, mas, a pedido da mãe, nunca beija ninguém.
Seu hit "Dom Dom Dom" tem mais de 1 milhão de visualizações no Youtube e faz referência a sexo oral. "Dom dom dom dom/ Dom dom dom/ Ajoelha, se prepara e...", canta MC Pedrinho, com a voz fina, no Youtube. O fim do refrão é impublicável.
Até sexta-feira, 460 mil pessoas seguiam um perfil no Facebook com seu nome. Contratá-lo para um show custa R$ 5.000. Só neste fim de semana ele fará cinco.
Seu nome é Pedro Maia. Ele cursa a sétima série em uma escola pública da Vila Maria, bairro onde mora na zona norte de São Paulo.
A carreira de Pedrinho no Funk Pesadão -como é chamada a vertente mais "sexy" do estilo musical- começou neste ano com "Dom Dom Dom". Teve mais uma nesse estilo, cujo refrão fala do movimento de uma vagina.
Acabou aí, diz o produtor Douglas Santos, que assumiu a carreira do garoto há um mês. "Nosso foco agora são músicas light, pra tocar na rádio e na TV", afirma. Santos está tentando retirar as várias versões pesadas da internet.
A mãe do garoto, a doméstica Analee Maia, 39, não via problema no Funk Pesadão do filho. "Desde que ele não cantasse na minha frente."
A versão "mais careta", que já toca em três rádios paulistanas, agora é "Dom Dom Dom/ Estava aqui no baile escutando aquele som."
Miúdo, Pedrinho é brincalhão. Faz piada e gosta de jogar Xbox. Dança bem e sonha em comprar uma casa com o dinheiro que ganha -hoje, mora num quartinho com a mãe e três irmãos.
Sua produtora promete que, nos próximos dias, ele se mudará com a família para um apartamento.
"Minha mãe disse que não era pra eu beijar na boca na escola por enquanto", conta ele, envergonhado.
Pedrinho não é um caso único. MCs, como são chamados os cantores de funk, com menos de 16 anos de idade pipocam em São Paulo. MC Matheus Monteiro, de 12 anos, canta músicas sobre luxo. "Vem mulher, dá um rolê de Santa Fé/ Na suíte do patrão, tu escolhe o que tu quer", diz uma delas.
A escolha pelo funk é também financeira. MCs de sucesso ganham bem. Com 21 anos, Guilherme Dantas, o MC Guimê, já recebe R$ 1,5 milhão por mês. Aos 15, Guilherme Alves, o MC Gui, faz apresentações que chegam a custar R$ 18 mil. 

Dissertação. Racismo no futebol

Texto 1

Banana para o racismo

Publicado por Luiz Flávio Gomes - 5 meses atrás
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A inesperada reação do jogador Daniel Alves diante de mais uma inescrupulosa ofensa racista no mundo futebolístico surpreendeu e repercutiu no mundo todo. Todo racismo constitui uma imbecilidade porque, desde logo, traz consigo um deplorável fundamentalismo, ancorado na suposição de uma superioridade individual sobre o seu semelhante. Nosso genial Lima Barreto (1881-1922), filho de escravos, escreveu: “A capacidade mental dos negros é discutida a priori e a dos brancos, a posteriori” (Contos Completos, Companhia das Letras, 2010, p. 602).
Só existe racismo porque algumas condutas irracionais contam com solidariedade grupal. Nada que um bom ensino de ética não possa mudar. Educação (disse o próprio Daniel Alves). O racismo nada mais é que uma manifestação de um preconceito, que é uma valoração desfavorável frente a alguma pessoa, que se caracteriza pela emocionalidade baseada em crenças, julgamentos ou generalizações sobre indivíduos ou grupos (veja Luís Mir, Guerra civil). Do preconceito se passa para a discriminação (ato que exterioriza um preconceito) e essa discriminação muitas vezes possui motivo racista.
O racista é um alienado porque ostensivamente discrimina outra pessoa, julgando-a gratuitamente uma inimiga, não por razões racionais, sim, em virtude de uma dinâmica social incivilizada. O racismo, tanto quanto o bullying, desapareceria da face da terra, se não tivesse o apoio social de setores da sociedade. O mais deplorável nele é o fato de o racista desumanizar a sua vítima, ou seja, julgá-la desumana ou sub-humana. Quando alguém é desumanizado por um indivíduo ou um grupo, a aberrante ofensa se torna absurdamente palatável no meio em que ele vive, ficando muitas vezes imune às repreensões morais, porque (consoante as convicções racistas) não se sancionam os ataques contra os inválidos, os inferiores, contra os desprezados, os discriminados.
Enquanto uma parcela das sociedades continuar aceitando a animalização ou desumanização dos semelhantes, não vamos nunca sair do grande meio-dia de Nietzsche, ou seja, não vamos nunca evoluir e aceitar que todas as populações saíram da África (e que a pelé branca não tem mais do que 10 ou 15 mil anos, que não são nada nesse transcurso do processo evolutivo darwiniano, que já conta com mais de 7 milhões de anos). Os discriminadores e xenófobos são, assim, bípedes ignorantes e incultos, que perambulam pela terra sem nenhuma noção do que é a ciência e a história. Sua estupidez somente não é maior que sua ignorância e sua irresponsabilidade intelectual e social. Uma banana, portanto, para o racismo e para os racistas!http://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/118053965/banana-para-o-racismo
TEXTO 2
RACISMO OU INJÚRIA RACIAL

TEXTO 3 fonte carta capital

A foto da esquerda todo mundo viu. É o craque Neymar com seu filho no colo e duas bananas, em apoio a Daniel Alves e em repulsa ao racismo no mundo do futebol.
Já a foto à direita, é do pigmeu Ota Benga, que ficou em exibição junto a macacos no zoológico do Bronx, Nova York, em 1906. Ota foi levado do Congo para Nova York e sua exibição em um zoológico americano serviu como um exemplo do que os cientistas da época proclamaram ser uma raça evolucionária inferior ao ser humano. A história de Ota serviu para inflamar crenças sobre a supremacia racial ariana defendida por Hitler. Sua história é contada no documentário “The Human Zoo”.
A comparação entre negros e macacos é racista em sua essência. No entanto muitos não compreendem a gravidade da utilização da figura do macaco como uma ofensa, um insulto aos negros.
Encontrei essa forte história num artigo sensacional que li dia desses, e que também trazia reflexões de James Bradley, professor de História da Medicina na Universidade de Melbourne, na Austrália. Ele escreveu um texto com o título “O macaco como insulto: uma curta história de uma ideia racista”. Termina o artigo dizendo que “O sistema educacional não faz o suficiente para nos educar sobre a ciência ou a história do ser humano, porque se o fizesse, nós viveríamos o desaparecimento do uso do macaco como insulto.”
Não, querido Neymar. Não somos todos macacos. Ao menos não para efeito de fazer uso dessa expressão ou ideia como ferramenta de combate ao racismo.
Mas é bom separar: Uma coisa é a reação de Daniel Alves ao comer a banana jogada ao campo, num evidente e corriqueiro ato racista por parte da torcida; outra coisa é a campanha de apoio a Daniel e de denúncia ao racismo, promovida por Neymar.
No Brasil, a maioria dos jogadores de futebol advém de camadas mais pobres. Embora isso esteja mudando – porque o futebol mudou, ainda é assim. Dentre esses, a maioria dos que atingem grande sucesso são negros. Por buscarem o sonho de vencer na carreira desde cedo, pouco estudam. Os “fora de série” são descobertos cada vez mais cedo e depois de alçados à condição de estrelas vivem um mundo à parte, numa bolha. Poucos foram ou são aqueles que conseguem combinar genialidade esportiva e alguma coisa na cabeça. E quando o assunto é racismo, a tendência é piorar.
E Daniel comeu a banana! Ironia? Forma de protesto? Inteligência? Ora, ele mesmo respondeu na entrevista seguida ao jogo:
“Tem que ser assim! Não vamos mudar. Há 11 anos convivo com a mesma coisa na Espanha. Temos que rir desses retardados.”
É uma postura. Não há o que interpretar. Ele elaborou uma reação objetiva ao racismo: Vamos ignorar e rir!
Há um provérbio africano que diz: “Cada um vê o sol do meio dia a partir da janela de sua casa”. Do lugar de onde Daniel fala, do estrelato esportivo, dos ganhos milionários, da vida feita na Europa, da titularidade na seleção brasileira de futebol, para ele, isso é o melhor – e mais confortável, a se fazer: ignorar e rir. Vamos fazer piada! Vamos olhar para esses idiotas racistas e dizer: sou rico, seu babaca! Sou famoso! Tenho 5 Ferraris, idiota! Pode jogar bananas à vontade!
O racismo os incomoda. E os atinge. Mas de que maneira? Afinal, são ricos! E há quem diga que “enriqueceu, tá resolvido” ou que “problema é de classe”! O elemento econômico suaviza o efeito do racismo, mas não o anula. Nesse sentido, os racistas e as bananas prestam um serviço: Lembram a esses meninos que eles são negros e que o dinheiro e a fama não os tornam brancos!
Daniel Alves, Neymar, Dante, Balotelli e outros tantos jogadores de alto nível e salários pouca chance terão de ser confundidos com um assaltante e de ficar presos alguns dias como no caso do ator Vinícius; pouco provavelmente serão desaparecidos, depois de torturados e mortos, como foi Amarildo; nada indica que possam ter seus corpos arrastados por um carro da polícia como foi Cláudia ou ainda, não terão que correr da polícia e acabar sem vida com seus corpos jogados em uma creche qualquer. Apesar das bananas, dificilmente serão tratados como animais, ao buscarem vida digna como refugiados em algum país cordial, de franca democracia racial, assim como as centenas de Haitianos o fazem no Acre e em São Paulo.
O racismo não os atinge dessa maneira. Mas os atinge. E sua reação é proporcional. Cabe a nós dizer que sua reação não nos serve! Não será possível para nós, negras e negros brasileiros e de todo o mundo, que não tivemos o talento (ou sorte?) para o  estrelato, comer a banana de dinamite, ou chupar as balas dos fuzis, ou descascar a bainha das facas. Cabe a nós parafrasear Daniel, na invertida: “Não tem que ser assim! Nós precisamos mudar! Convivemos há 500 anos com a mesma coisa no Brasil. Temos que acabar com esses racistas retardados, especialmente os de farda e gravata”.
Quanto a Neymar, ele é bom de bola. E como quase todo gênio da bola, superacumula inteligência na ponta dos pés. Pousa com seu filho louro, sem saber que por ser louro, mesmo que se pendure num cacho de bananas, jamais será chamado de macaco. A ofensa, nesse caso, não fará sentido. Mas pensemos: sua maneira de rechaçar o racismo foi uma jogada de marketing ou apenas boa vontade? Seja o que for, não nos serve.
Sou negro, nascido em um país onde a violência e a pobreza são pressupostos para a vida da maior parte da população, que é negra. Querido Neymar – mas não: Luciano Hulk, Angélica, Reinaldo Azevedo, Aécio Neves, Dilma Rousseff, artistas e a imprensa que, de maneira geral, exaltou o “devorar da banana” e agora compartilham fotos empunhando a saborosa fruta, neste país, assim como em todo o mundo, a comparação de uma pessoa negra a um macaco é algo culturalmente ofensivo.
Eu como negro, não admito. Banana não é arma e tampouco serve como símbolo de luta contra o racismo. Ao contrário, o reafirma na medida em que relaciona o alvo a um macaco e principalmente na medida em que simplifica, desqualifica e pior, humoriza o debate sobre racismo no Brasil e no mundo.
O racismo é algo muito sério. Vivemos no Brasil uma escalada assombrosa da violência racista. Esse tipo de postura e reação despolitizadas e alienantes de esportistas, artistas, formadores de opinião e governantes tem um objetivo certo: escamotear seu real significado do racismo que gera desde bananas em campo de futebol até o genocídio negro que continua em todo o mundo.
Eu adoro banana. Aqui em casa nunca falta. E acho os macacos bichos incríveis, inteligentes e fortes. Adoro o filme Planeta dos Macacos e sempre que assisto, especialmente o primeiro, imagino o quanto os seres humanos merecem castigo parecido. Viemos deles e a história da evolução da espécie é linda. Mas se é para associar a origens, por que não dizer que #SomosTodosNegros ? Porque não dizer #SomosTodosDeÁfrica ? Porque não lembrar que é de África que viemos, todos e de todas as cores? E que por isso o racismo, em todas as suas formas, é uma estupidez incompatível com a própria evolução humana? E, se somos, por que nos tratamos assim?
Mas não. E seguem vocês, “olhando pra cá, curiosos, é lógico. Não, não é não, não é o zoológico”.
Portanto, nada de bananas, nada de macacos, por favor!
...............................................TEXTO 4
fonte folha de sp
JOEL RUFINO DOS SANTOS
TENDÊNCIAS/DEBATES
Banana é bom e faz crescer
Desde que o futebol virou uma profissão, craques negros são hostilizados. A vergonha de ser racista é que acabou, ou está acabando
Há 70 anos, havia consenso entre os analistas sobre o declínio do racismo antinegro no Brasil. Modernização capitalista, miscigenação intensa e continuada garantiam essa previsão. A promiscuidade entre as raças, para o bem e para o mal, impedira a segregação --que marcava, essa sim, o caso norte-americano.
Os brasileiros negros, quando se organizavam em clubes recreativos, de autoajuda, escolas noturnas profissionalizantes, declaravam querer isso: integrar o negro, fazendo-o valer mais no mercado de trabalho para, dessa forma, participar do progresso nacional. Queriam se sentir tão ou mais brasileiros que os outros.
Após 125 anos do fim do escravismo --do escravismo, porque o trabalho escravo ainda existe--, as manifestações de racismo antinegro explodem nos estádios brasileiros.
Muitos se surpreenderam com a agressão da torcida do Mogi ao meia Arouca, do Santos, em março, no dia seguinte à agressão sofrida por um juiz no Rio Grande do Sul. No entanto, desde que o futebol virou uma profissão, lá por 1930, grandes craques negros --um Fausto, um Jaguaré, um Valdemar, um Leônidas, um Zizinho, um Pelé-- e pequenos, cujo número é infinito, foram hostilizados e prejudicados pelo racismo. Os que agora se surpreendem --cronistas, apresentadores, jogadores, técnicos-- não aprenderam na escola como nosso país se formou. De brincadeira, vão dizer que faltaram a essa aula. Não sejam rigorosos consigo mesmos, os que foram à escola não tiveram essa aula. Monteiro Lobato confessou que a única coisa que se lembra da história do Brasil é que o bispo Sardinha foi devorado pelos caetés.
Todos sabem que o Brasil teve escravidão. Alguma coisa nos impede de saber mais. Em alguma aula do curso elementar, nos disseram que "os negros foram escravos porque os índios não se adaptaram à escravidão". Como se diz na gíria, fala sério. A escravidão de índios no Brasil foi a maior da América do Sul, durou 250 anos. A dos negros, 350. O racismo, antinegro e anti-índio, é uma das colunas da formação brasileira.
O nosso racismo é envergonhado, tanto que alguém acusado de preconceito e discriminação racial se defende dizendo que tem amigos e, às vezes, até parentes negros. Diante de uma ofensa racista, sentimos vergonha pelo ofensor --no fundo, de nós mesmos. Tinga e Arouca são artistas doces e inteligentes da bola, que vergonha por quem os agrediu! Temos racismo em todas as suas formas --o preconceito, mais brando, a discriminação, mais eficaz, o racismo propriamente dito, estrutural, que organizou as nossas relações de trabalho, nossos hábitos, nossa moral pública.
No Carnaval, um bloco cantou: "Olha a cabeleira do Zezé, será que ele é, será que ele é?". O que se insinua aí é que todos sabem que ele é, mas precisam comunicar a condição do Zezé. Bom, essa é uma peculiaridade do racismo brasileiro: como tem vergonha de ser, é preciso uma rede Brasil curtir a novidade, sem exceção. O país sempre foi racista --e chega a comover o esforço de militantes do movimento negro para convencer o Brasil do óbvio.
Por que a perda da vergonha? Um dos vetores deve ser a barbárie, palavra que tem milhares de acepções. Aqui é a vida que transcorre toda no estágio dos instintos primários: reproduzir, comer, sobreviver. Ou dito de outra maneira: sexo, consumo, violência. Há uns 50 anos, a vida do mundo civilizado parece caminhar para trás, não se diferenciando mais da vida primitiva. Não há hoje povo conhecido sobre a Terra que seja bárbaro. Todos criaram uma teia, às vezes fina, às vezes densa, de civilização --poesia, música, curiosidade intelectual, língua, filosofia, fundamento (outro nome de tradição) e destino (transcendência). Salvo as massas urbanas. Essas estão prontas, "everytime", "everywhere", para o espetáculo das torcidas organizadas.
A vergonha de ser racista é que acabou, ou está acabando. Se na Copa pularem feito macacos atirando bananas no campo, dou meu conselho aos jogadores negros. Façam como Daniel Alves esta semana: descasquem as bananas e comam. Essa também é uma tradição brasileira: o que vem a gente traça. No final do processo digestivo, a ofensa se transformará no que verdadeiramente é --aquela "coisa" amarelada.

    Educaçao para o Século XXI, o que falta aprender.. Texto para resumir. Fundamental, ele analisa o PISA de 2013

    O Estadão pede que a gente entre no site dele. Façamos isso, pois é texto é bom e nos dá subsídios para quaisquer argumentações sobre a educação


    http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,educacao-para-o-seculo-21-o-que-falta-aprender-imp-,1564600

    domingo, 28 de setembro de 2014

    FILME. O POVO BRASILEIRO. DARCY RIBEIRO

    http://docverdade.blogspot.com.br/2009/03/o-povo-brasileiro-darcy-ribeiro.html

    O vício e as drogas


    Sociedade Fissurada – Para pensar as drogas e a banalidade do mal, livro de Marcia Tiburi e Andréa Costa Dias, tem por mérito combinar reflexão filosófica e psicológica na abordagem dos difíceis temas do vício e das drogas. O livro é dividido em duas partes. A primeira, mais extensa, coube à análise filosófica de Marcia Tiburi; a segunda, de viés sociopolítico e psicológico, à Andréa Costa Dias.
    Ambas as autoras submetem o tema à questão moral e política, combinando referências teóricas sempre indicadas. O texto de Andréa Dias se constitui em um aparato teórico crítico associado a uma experiência com o universo das drogas e o espaço que esta ocupa na sociedade. Empiricamente mais distante deste cenário, Tiburi reflete sobre o fundamento deste, ampliando seu sentido de maneira a reconceituar os termos em questão – o vício e a droga – e a relação entre estes, tendo na base da discussão um conceito abrangente de “fissura”. O referencial teórico indicado pelas autoras pode mapear um entendimento prévio se o leitor for familiarizado com as teorias de Foucault, Agamben, Adorno, Arendt, Deleuze, Türcke, para falar dos autores reunidos em torno da discussão atual sobre biopolítica. Generosas, as autoras incorporam outros autores de diferentes áreas, no diálogo que é travado separadamente na escrita.
    Na primeira parte do livro, Tiburi constrói, em diferentes seções, uma argumentação clara e consistente em torno do tema – diretamente relacionado ao cotidiano das pessoas, às esferas da moralidade e da violência. Parte de uma certeza: para conhecer o registro ambíguo da dor e do prazer, fomentado pelas drogas, é preciso vencer o moralismo. E, para tanto, faz-se premente uma distinção entre ética e moral, entendendo por moral a parte irrefletida da ética e por ética o resultado do pensamento reflexivo. A eleição de uma perspectiva ética pela autora elimina prontamente a associação entre vício e droga como termos comumente enredados num círculo vicioso, que determina a condenação moral do viciado ou drogado, tratando-os por associação. Verificar, em primeiro lugar, o antigo par de opostos da cultura – virtude e vício –, ao refletir sobre o que se institui como virtude moral em nossos dias, é o primeiro passo dado para desfazer a oposição entre virtude e vício. Pois que, por virtude, entendemos valores que se encontram permeados pelo universo do trabalho no sistema capitalista, seu comprometimento ideológico, refletido não apenas na forma do discurso em esfera pública, mas como conjunto de valores incrustados em hábitos na camada mais fina e superficial da sociedade. Essa prospecção crítica é o cuidado que permeia a exposição de Tiburi que, capítulo a capítulo, adensa-a em camadas. O ponto de vista ético da autora é claro: “Pensar eticamente a questão das drogas é a tarefa urgente no contexto do moralismo ditatorial, que tem validade como falsa consciência, a ideia de uma verdade aceita por todos e que vige apenas porque repetida, sustentando as coisas como elas são”.
    A sinceridade de Marcia Tiburi se apresenta no trabalho do conceito certa de que há “uma história subterrânea a ser avaliada”. O conceito base para o entendimento da droga é o vício; em sua base, encontramos, portanto, a moralidade e a alienação do indivíduo na sociedade fissurada. Fissura em duplo sentido: como ruptura e como anseio, ânsia de recobrir o que foi rompido. Desta camada mais profunda – que supõe não somente a fissura-cisão entre indivíduo e sociedade, mas a cisão da subjetividade na configuração de um sujeito que não é mais íntegro, que perdeu algo, mas não o sabe perdido, e que se lança na procura fissurada por aquilo que não conhece ou reconhece mais –, chegamos com Tiburi da camada mais profunda à superfície: à esteticomania e à uma ontologia do corpo fissurado. É preciso acompanhar esse movimento de pensamento ao longo dos capítulos fartos em reflexões instigantes com outros filósofos. Dizer que Tiburi coloca o dedo na ferida seria repeti-la. Sua crítica é o movimento oposto ao da superfície, esta que se torna, contudo, a instância daquilo que pode ser comunicado sobre o incomunicável, o dizer do que não é dito.
    Na segunda parte do livro, voltamos à questão inicial, que poderia ser a do leitor desde o início: Por que ainda falar sobre as drogas? As razões desenvolvidas por Andréa Dias nos capítulos subsequentes demonstram a necessidade desta fala, com base na reflexão e no conhecimento não só de processos psicológicos internos, como de aspectos que determinam os espaços políticos nos quais estes se desenvolvem. É neste sentido que a autora lança a seguinte questão: “Como falar de crack sem mencionar a cracolândia paulistana? (…) E como compreender reflexivamente o espaço da cracolândia?”. A denominação de “subgente” em oposição ao que é ser “gente” qualifica a fissura social e política que aprofunda a distinção num plano que reúne, necessariamente, o psicológico ao social e ao político.
    A leitura desta obra, portanto, parece ser de grande elucidação do tema tratado, ao percorrer um trabalho teórico composto e motivador para a autorreflexão do leitor. A fundamentação filosófica de Tiburi é aprimorada, pertinente, fortemente autoral e, ao mesmo tempo, humilde na disposição de debater com autores consagrados, autores reconhecidos ou não. Negativamente criticável é um pequeno pudor renitente quando a autora utiliza os filmes em seus comentários. Associar o filme à televisão é possível, mas não em sua natureza. Um pudor certamente provindo da formação adorniana, mas que foi definitivamente salvo por Fassbinder, e o filme muito bem escolhido e analisado: Die Sehnsucht der Veronika Voss.Sehnsucht, traduzido no título em português por “desespero”, perdeu não só a riqueza da palavra, mas um jogo de significados que serviria de grande enlace ao tema. Sehnsucht é também die Sucht zu sehnen (a dependência pelo ansear), um doloroso desejo de autoalimentação que não encontra a paz, não porque ele não pode atingir o objeto desejado, não porque o objeto permanece escondido, mas simplesmente porque não pode ser objetivado”. Veronika Voss, de Fassbinder, é um desses poucos filmes que mostram que o longa já há algum tempo foi aceito não só como objeto de reflexão filosófica, mas como meio de reflexão filosófica, como o foi a literatura do século 19 para a filosofia do século 20. À parte o conceito de indústria cultural adorniano cujo teor crítico devemos certamente compartilhar, mas não adotar como preconceito, é preciso considerar também que filmes mantêm uma abertura à recepção subjetiva e que sua estrutura se mantém naquele fio da navalha, podendo ser tanto meio de reflexão quanto objeto de mera distração. Acredito que o livro teria tido uma coesão maior se tivesse tomado menos esse rumo e mantido mais o perfil analítico-crítico, com a forte ênfase na reflexão ético e estética de Marcia Tiburi, reunido às reflexões e experiência de Andréa Dias.
    Carla Milani Damião é professora de Estética na Faculdade de Filosofia da Universidade Federal de Goiás
    Sociedade Fissurada – Para pensar as drogas e a banalidade do malAndréa Costa Dias e Marcia TiburiCivilização Brasileira
    304 págs. – R$ 30

      interpretação de textos da UEL

      Leia o fragmento da notícia a seguir.
      A Polícia Militar do Rio de Janeiro informou que 20 policiais feridos estão presos no prédio da Alerj (Assembleia
      Legislativa do Rio de Janeiro), nesta segunda-feira (17), no centro do Rio, à espera de atendimento
      médico. Um grupo de cerca de 10 PMs chegou há pouco no local, atirando balas de borracha e bombas de
      gás a fim de dispersar os manifestantes que continuam jogando pedras e bloqueando a portaria dos fundos
      do edifício histórico.
      (Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/06/17/cinco-pms-feridos-aguardam-socorro-na-alerj-
      -manifestantes-continuam-jogando-pedras.htm>. Acesso em: 17 jun. 2013.)
      a) Com base na leitura do texto e nos conhecimentos sobre as regras gramaticais, compare e explique a
      função desempenhada pela palavra “que” nas duas ocorrências em negrito.
      b) O trecho sublinhado no fragmento da notícia poderia ser introduzido por vírgula. Dessa forma, o mesmo
      período poderia ser transcrito a seguir.
      Um grupo de cerca de 10 PMs chegou há pouco no local atirando balas de borracha e bombas de gás a
      fim de dispersar os manifestantes, que continuam jogando pedras e bloqueando a portaria dos fundos do
      edifício histórico.
      Explique as diferenças de sentido do trecho “que continuam jogando pedras e bloqueando a portaria dos
      fundos do edifício histórico” nas duas situações, isto é, no uso com vírgula e no uso sem vírgula.
      ....................................


      A família é a associação estabelecida por natureza para suprir as necessidades diárias dos homens. Mas,
      quando várias familias estão unidas em certo número de casas, e essa associação aspira a algo mais do
      que suprir as necessidades cotidianas, constitui-se a primeira sociedade, a aldeia. Quando várias aldeias
      se unem em uma única comunidade, grande o bastante para ser autossuficiente (ou para estar perto disso),
      configura-se a cidade, ou Estado – que nasce para assegurar o viver e que, depois de formada, é capaz de
      assegurar o viver bem. A cidade-Estado é a associação resultante daquelas outras, e sua natureza é, por
      si, uma finalidade: porque chamamos natureza de um objeto o produto final do processo de aperfeiçoamento
      desse objeto, seja ele homem, cavalo, família ou qualquer outra que tenha existência. Por conseguinte, é
      evidente que o Estado é uma criação da natureza e que o homem é, por natureza, um animal político.
      (Adaptado de: ARISTÓTELES. A Política. São Paulo: Nova Cultural, 2000. p.145-146.)
      Tendo como referência o pensamento político de Aristóteles na obra A Política, disserte sobre a relação entre o
      cidadão e a Cidade (pólis).

      Tendo como referência o pensamento político de Aristóteles na obra A Política, disserte sobre a relação entre o

      cidadão e a Cidade (pólis).



      PROPOSTA SOBRE O RACISMO

      TEXTO 1

      Racismo é impunidade - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

      CORREIO BRAZILIENSE - 29/04
      O racismo envergonhado lembra história que figura em manuais de psicologia. Cedinho, a criança entra assustada no quarto dos pais. Queixa-se de que há um monstro debaixo da cama. Eles atribuem o medo a pesadelo. Acalmam-na e a deixam acabar o soninho ali mesmo. Na manhã seguinte, o episódio se repete. A resposta também. No terceiro dia, a menina não aparece. Pai e mãe estranham. Tomados por mau pressentimento, entram no dormitório da filha. Ela está morta, corpinho estraçalhado.
      Fechar os olhos para a realidade, ensina a narrativa, pode dar alívio momentâneo, mas não resolve o problema. Ao contrário. Agrava-o. Racismo é fato. No Brasil, manifesta-se em diferentes situações com tal frequência que pode parecer natural como o suceder dos dias e das noites ou das estações do ano. É o caso da seleção para empregos, da escolha de cargos em comissão, da indicação de ocupantes do alto escalão. O andar de cima tem cor. É branco. Um colorido aqui ou ali atesta: a exceção confirma a regra.

      A vergonha não constitui marca verde-amarela. Espalha-se mundo afora. Dois episódios do fim de semana servem de triste confirmação. Ambos têm relação direta com o esporte - alvo frequente de expressões de intolerância com as diferenças. Em confronto de Barcelona e Villareal, torcedor atirou uma banana no campo em direção a Daniel Alves. O brasileiro reagiu com elegância. Pegou a fruta, descascou-a e a comeu. A resposta, divulgada pelas redes sociais, ganhou repercussão internacional.

      Em solidariedade ao colega, Neymar postou no Instagram foto com o filho, Davi Lucca. Os dois com banana na mão e a mensagem: #somostodosmacacos. Na primeira hora, 8 mil pessoas retuitaram a hashtag. A presidente Dilma Rousseff condenou o ato do torcedor em notas postadas nas redes sociais. Barack Obama também se manifestou, mas em reação a episódio similar ocorrido nos Estados Unidos.

      Áudio atribuído a Donald Sterling, presidente do time de basquete Los Angeles Clippers, vazou a recomendação feita por ele à namorada para que não exibisse em público associação com negros: "O pouco que estou lhe pedindo", diz, "é não fazer publicidade em torno disso e não trazê-los para os meus jogos". O fato, como não poderia deixar de ser, revoltou os jogadores da Associação Americana de Basquete (NBA), formada predominantemente por atletas negros.

      Não se deve ao acaso a repetição de agressões racistas. Elas se devem à impunidade. Depois dos atos que envergonham as consciências civilizadas do planeta, sobram palavras e faltam ações. Impõem-se penas capazes de inibir ofensas do gênero nos estádios. Sanções brandas - advertências, multas, suspensão de torcedores ou de alas em estádios - provaram ser insuficientes. É hora de punições exemplares. Duas foram anunciadas ontem. O Villarreal proibiu o torcedor intolerante de frequentar o estádio do time. O Los Angeles Clippers perdeu patrocinadores. Que venham outras.

      Interpretação de textos, duas questões. A idealização da inveja - RODRIGO CONSTANTINO O GLOBO - 29/04


      O GLOBO - 29/04

      Os invejosos são aqueles que preferem prejudicar os ricos em vez de ajudar os pobres

      Se ontem eu usava carroça como meio de transporte, e hoje posso dirigir meu próprio carro, eu piorei ou melhorei minha situação? Se eu não tinha acesso a computadores e internet, e hoje tenho, minha qualidade de vida melhorou ou piorou? Se consumo hoje bem mais proteína, e tenho acesso a muito mais remédios, devo ficar feliz ou triste?

      Essas parecem perguntas bobas, até sem sentido, pois as respostas são óbvias. Ou nem tanto. Há um grupo enorme de pessoas na esquerda que não valoriza tais conquistas, pois ignora os avanços dos mais pobres em relação ao seu passado, focando apenas no hiato entre eles e os mais ricos.

      Ou seja, se antes eu tinha que usar carroça e hoje posso curtir meu próprio carro, isso não importa, caso meu vizinho tenha um carrão mais luxuoso. As esquerdas são obcecadas com a questão da desigualdade material, com o gap entre ricos e pobres, sem levar em conta o avanço na condição de vida dos mais pobres sob o capitalismo, que é impressionante.

      Pensemos por um minuto na vida de um trabalhador americano de classe média hoje. Ele possui um carro com segurança e conforto, ar-condicionado em sua casa, computador e internet, inúmeros tratamentos modernos para todo tipo de doença, fartura de alimentos frescos etc. Compare-se isso ao estilo de vida de um nobre medieval, e ficará claro o incrível progresso capitalista.

      Mas os socialistas só se importam com a distância entre ricos e pobres, não com a distância entre os pobres de hoje e os pobres de ontem, ou os pobres dos países mais capitalistas e os pobres de países menos capitalistas. Por que tanta obsessão com a desigualdade em si, em vez de se preocupar com o nível absoluto de miséria?

      Parte da explicação é a premissa absurda de que a economia é um jogo de soma zero, que a riqueza é estática. Assumem que José é rico porque João é pobre, ignorando que ambos podem ter ficado bem mais ricos com o passar do tempo. Enxergando apenas um bolo fixo, focam somente em sua divisão mais igualitária. Já os liberais sabem que o capitalismo é o fermento que faz o bolo como um todo crescer sem parar, graças aos ganhos de produtividade.

      Outra parte da explicação tem caráter mais psicológico. A inveja é a mais mesquinha das paixões humanas, disse John Stuart Mill. Infelizmente, ela está enraizada em nossa natureza. Os invejosos são aqueles que preferem prejudicar os ricos em vez de ajudar os pobres. Acham que podem correr mais se o vizinho quebrar as pernas.

      Partindo desse pressuposto, podemos concluir que o socialismo é a idealização da inveja. Basta notar que sempre atacam mais os ricos do que qualquer outra coisa. Não desejam efetivamente melhorar a vida dos pobres, pois isso se faz com mais capitalismo. Querem resultados iguais porque não suportam as diferenças, não toleram o fato de que alguns conseguem acumular fortunas, ainda que oferecendo bens e serviços que melhoram a vida de todos nós.

      Thatcher dizia que a Inglaterra precisava de mais milionários e mais bancarrotas. Ela sabia que quem cria riqueza são os empreendedores, aqueles que arriscam o próprio capital ou o de terceiros em empreitadas inovadoras, que nem sempre vingam. E condenava a esquerda socialista justamente por preferir reduzir a diferença entre ricos e pobres mesmo que tornando os pobres mais pobres.

      O novo guru das esquerdas, o francês Thomas Piketty, virou sensação simplesmente porque resgatou o velho marxismo sob nova embalagem. Sua proposta de taxar em até 80% os mais ricos é apenas o antigo ranço igualitário mascarado de altruísmo. Punir os mais ricos nunca ajudou de verdade os mais pobres. Mas bandeiras demagógicas como essa tocam fundo nos corações mais invejosos, ansiosos por destruir as diferenças materiais no mundo.

      Seres humanos não são insetos gregários. Felizmente, somos diferentes. Cada um tem sua habilidade, sua vocação, sua inteligência e sua própria sorte. Sem falar do mérito e do esforço totalmente desiguais. É claro, portanto, que os resultados serão também muito diferentes.

      Não existem milhões de jogadores com o talento de Neymar, ou milhões de modelos com a beleza e o carisma de Gisele Bunchen. Tampouco existem milhões de empresários como Jorge Paulo Lemann. É injusto que ganhe muito mais com seu talento específico?

      Confiscar o patrimônio dos mais ricos vai apenas afugentar aqueles com mais capacidade de criar riqueza. A França já está sofrendo com isso. Mas a esquerda não liga, pois seu objetivo não é gerar mais riqueza para todos, e sim tirá-la dos que têm mais. Pura inveja.

      INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS , 2 PERGUNTAS. Sou branco, posso avaliar racismo?

      Crítica de televisão do "New York Times" há mais de uma década, Alessandra Stanley já viveu algumas vezes a experiência de passar de estilingue a vidraça por conta de textos polêmicos ou erros que cometeu. Nunca, porém, provocou tamanho barulho quanto nesta semana.
      Em um texto sobre Shonda Rhimes, responsável pela criação de duas séries de muito sucesso, "Grey's Anatomy" e "Scandal", a crítica do principal jornal americano recorreu a um estereótipo racista para classificá-la ("angry black woman"), além de ter feito observações consideradas condescendentes sobre a produtora negra.
      Comentando o caso em seu blog, a "public editor" (ombudsman) do jornal, Margaret Sullivan, observou que, nos mais de dois anos em que ocupa o cargo, poucos assuntos provocaram tantas e tão apaixonadas reações quanto o texto de Stanley.
      Ouvida por Sullivan, a crítica disse que foi mal compreendida e que o texto tinha a intenção de elogiar Rhimes. A menção ao estereótipo racista, disse, foi feita com o objetivo de mostrar como a produtora o superou.
      Não satisfeita com a resposta, a "public editor" cobrou explicações da editora de cultura do "New York Times", que defendeu o texto, acrescentando que ele foi lido por três jornalistas antes de ser publicado.
      Sullivan recorreu, então, a Dean Baquet, editor-executivo do jornal. Trata-se do primeiro jornalista negro a ocupar o principal cargo do "New York Times". Baquet também considera que Alessandra Stanley foi mal compreendida, mas enxerga um problema no perfil racial dos críticos de cultura do jornal –dos 20 que atuam hoje, 18 são brancos e não há nenhum negro.
      Este caso, que certamente terá outros desdobramentos, ocorre ao mesmo tempo em que, no Brasil, acontece a discussão de se um seriado da Globo, "Sexo e as Negas", tem conteúdo racista. Muitas das críticas se referem ao fato de Miguel Falabella, criador do programa, ser branco e não conhecer a realidade dos negros que retrata.
      Após assistir ao primeiro episódio, observei em meu blog no UOL que não vi racismo no programa. O comentário provocou uma mesma reação em alguns leitores, segundo os quais eu não tenho condições de fazer esta avaliação pelo fato de ser branco.
      Entendo a lógica da observação, e concordo que um crítico de TV negro pode enxergar de forma diferente a série. Mas limitar a avaliação de programas dessa forma não apenas contraria a natureza do trabalho jornalístico como significa uma forma de limitar o debate e a troca de ideias.
      Muito da indignação que a série causou deve-se ao título. O uso da palavra "negas", de fato, causa um incômodo. Não dei muita importância a isso quando a polêmica se instalou, mas hoje, após ver dois episódios, vejo que foi um erro grave da Globo.
      O título, no fundo, desvia a atenção do espectador. "Sexo e as Negas" acompanha a trajetória de quatro mulheres negras da periferia do Rio colocando em planos iguais a busca delas por diversão e prazer e a luta pela sobrevivência.
      O programa não faz a denúncia do racismo ou do sexismo com a eloquência que os militantes da igualdade racial e da discriminação sexual gostariam. Mas está longe de endossar estes preconceitos. Ao contrário, insisto. Por meio da comédia, "Sexo e as Negas" consegue colocar o dedo na ferida. 
      maurício stycer
      Maurício Stycer é jornalista, repórter e crítico do portal UOL, autor de 'História do Lance!' (Alameda Editora). Escreve aos domingos.

      Interpretação de textos. O silêncio dos inocentes - CONTARDO CALLIGARIS

      NÃO ESTÁ PRONTA

      FOLHA DE SP - 31/07


      Uma cultura pode morrer de sua própria covardia em defender as ideias que ela inventa e promove


      O movimento Estado Islâmico (EI) controla uma parte consistente do território que pertencia previamente à Síria e ao Iraque (sei que "consistente" é vago, mas as cidades passam de mão em mão a cada dia). Nesse vasto território, o EI proclamou um califado, e seu líder, em 11 de julho, ordenou a mutilação genital de todas as mulheres entre 11 e 46 anos.

      A mutilação genital consiste na ablação do clítoris e, em algumas tradições, de parte dos lábios da vagina. A operação geralmente é feita sem anestesia e sem condições de assepsia. Essa tortura com consequências potencialmente mortais garantiria que as mulheres não sintam (mais) prazer sexual, ou seja, como noticiaram as agências de imprensa (Folha de 25/07), evitaria "a expansão da libertinagem e da imoralidade" no sexo feminino.

      Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), a medida do califado pode atingir 4 milhões de mulheres.

      Será como em julho de 1994, quando assistimos de longe, indignados e resignados, ao massacre de mais de meio milhão de pessoas da etnia tutsi, em Ruanda?

      Será como em 1995 (de novo, em julho), quando assistimos ao massacre de Srebrenica, na Bósnia? Neste caso, um mês depois, o bombardeio dos sérvios-bósnios pela Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) colocou um fim à guerra da Bósnia. Foi tarde para os 8.000 de Srebrenica, mas foi ao menos isso.

      Meus furores intervencionistas são raramente abstratos. Há intervenções impossíveis porque é dificílimo tomar partido, e outras que custariam mais vidas do que salvariam. Também me envergonha, na hora de me indignar, o fato de que os que se armariam e arriscariam sua vida seriam outros, mais jovens do que eu.

      Mesmo assim, penso que o genocídio em Ruanda, em 1994, poderia ter sido evitado e que o bombardeio das posições dos sérvios-bósnios em 1995 poderia ter acontecido antes, evitando o massacre de Srebrenica.

      No caso de Ruanda, foi dito mil vezes que o Ocidente deixou o horror acontecer porque o coração da África está longe, geográfica e culturalmente. Da mesma forma, foi dito que a Otan interveio na Bósnia por se tratar de um horror "em casa", na Europa.

      Mas a intervenção na Bósnia tornou-se possível e "necessária" também por uma outra razão, um pouco mais complexa.

      Na guerra da Bósnia, as grandes vítimas eram os bósnios muçulmanos, ameaçados de extermínio pelos sérvios-bósnios (ortodoxos). Atrás de qualquer consideração geopolítica, os membros europeus da Otan (sobretudo Alemanha, França e Inglaterra) podiam enxergar, no ódio dos sérvios-bósnios, uma caricatura do preconceito de suas populações contra os muçulmanos imigrantes.

      Ou seja, talvez a gente seja especialmente motivado a intervir contra quem pratica horrores dos quais nós mesmos receamos ser capazes. É policiando os outros que a gente luta contra nossos próprios demônios.

      Se a ordem do califado me indigna tanto é porque reconheço a sua estupidez: ela é a mesma que, apenas 200 anos atrás, levava psiquiatras europeus a cauterizar com ferro quente o clítoris de meninas que se masturbavam com uma frequência que pais e padres achavam excessiva.

      Houve uma época (recente --e nem sei se acabou) em que o desejo feminino nos fazia horror, e a gente estava disposto a qualquer coisa para silenciá-lo. É esse passado que nos daria o direito de intervir.

      Não se trata de querer abolir uma diversidade cultural. Certamente há mulheres, no califado, dispostas a ser mutiladas para continuar pertencendo plenamente à cultura na qual elas vivem. Mas o que acontecerá conosco se escutarmos os gritos das que não concordam e deixarmos que se esgotem, até que reine o silêncio dos inocentes sacrificados?

      Em Veneza, no Teatro La Fenice, três semanas atrás, assisti a uma apresentação (única) de "Hotel Europa", de Bernard-Henri Lévy (publicado pela editora Marsilio numa edição bilíngue, com textos em italiano e francês). É o monólogo de um intelectual que, num hotel de Sarajevo, prepara uma conferência impossível sobre a Europa e seus valores. Lévy foi marcado pela sua presença na Bósnia durante os anos da guerra e acredita na necessidade moral de intervir nos horrores da casa dos outros.

      Concordo ou não, tanto faz; de qualquer forma, saí da peça com a convicção de que uma cultura pode morrer de sua própria covardia em defender as ideias que ela inventa e promove. E nossa cultura é ameaçada por esse destino: ela tem, ao mesmo tempo, um repertório fantástico de ideias e uma grande timidez na hora defendê-las --até porque uma dessas ideias é que cada um deve ser livre de pensar como quer.